Governo e Congresso não controlam a agência de espionagem

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Juliana Rodrigues Malafaia, advogada Juliana Rodrigues Malafaia, advogada, durante o julgamento da "milícia digital" de Jair Bolsonaro — (STF/Reprodução)

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Começou o julgamento dos acusados de participar da “milícia digital” que disseminou notícias falsas durante a temporada eleitoral de 2022 em apoio à tentativa de golpe de estado liderada por Jair Bolsonaro.

O caso ficou conhecido como “Abin paralela”, porque sobram evidências da existência de uma estrutura autônoma na Agência Brasileira de Inteligência (Abin) montada para espionar adversários e aliados de Bolsonaro, atacar o Judiciário, as urnas eletrônicas e a credibilidade do processo eleitoral.

No banco dos réus estão cinco militares (três da ativa), um policial federal e um empresário (Carlos Cesar Moretzsohn Rocha, do Instituto Voto Legal) que o Partido Liberal contratou para levantar dúvidas sobre o voto eletrônico. Foi produzido um laudo falso sobre suposta vitória de Bolsonaro nas urnas, contra Lula. O PL usou alguns o papel para contestar o processo eleitoral. A Justiça respondeu ao partido com multa recorde (22 milhões de reais) por litigância de má-fé.

É provável que o grupo seja condenado por excesso de provas. Uma delas mostra o uso e o abuso de uma ferramenta de vigilância (First Mile), cuja licença custou ao governo cinco milhões de reais, para espionar telefones de adversários políticos sem autorização judicial, interferência ou conhecimento das empresas operadoras de telefonia.

Isso aconteceu quando a Abin era dirigida por Alexandre Ramagem, delegado da Polícia Federal e deputado federal pelo Partido Liberal do Rio. Ele já foi condenado em outro processo a 16 anos, um mês e 15 dias de prisão, inicialmente em regime fechado, por tentativa de golpe de estado.

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O caso da “Abin paralela” expôs no STF a anarquia na condução e operação da agência de espionagem, que é vinculada ao gabinete do presidente da República. Isso ganhou cores fortes no governo Bolsonaro, mas, na realidade, é resultado de quatro décadas de alienação.

Governos, partidos políticos e o Congresso nunca levaram a sério a formulação, execução e controle de uma política nacional de informações e sempre trataram a agência de espionagem como instrumento político.

Na sessão de julgamento desta terça-feira (14/10), a advogada de um dos réus lembrou que a Abin até realiza ações sigilosas, mas “não tem sua atuação disciplinada por lei”.

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Juliana Rodrigues Malafaia defende o subtenente do Exército Giancarlo Rodrigues, que serviu na Abin e é acusado de espionagem ilegal de adversários do governo Bolsonaro.

No julgamento, ela chamou a atenção para o descaso institucional com a Abin. Mostrou que governo e Congresso não controlam a agência de espionagem. Citou documentação da Procuradoria-Geral da República sobre “ausência de supervisão” e “informalidade das ordens” na rotina de uso de ferramentas de espionagem, cujos dados não são rastreáveis ou auditáveis.

Esse quadro impede a identificação até dos agentes que administram e operam os sistemas da Abin e, por isso, a procuradoria indiciou 36 servidores que estiveram envolvidos na coleta de dados, na análise e na produção de informações sobre a segurança do sistema eleitoral, sem justificativa e por encomenda do então chefe da agência, Alexandre Ramagem.

A advogada argumentou aos juízes: “A Abin não sabe dizer quem fez as pesquisas. Não sabe esclarecer quantas foram feitas e quando. Não sabe dizer a quem as pesquisas eram devolvidas. Ou seja, não existe nenhum tipo de controle. Aparentemente, a Abin é só um órgão estatal sem controle. É isso. É o que dá para perceber, para destrinchar nos autos: a Abin não tem mesmo nenhum tipo de controle.”

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