Como fica a vida de reféns e prisioneiros libertados por Israel e Hamas?

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Deutsche Wellei Deutsche Welle https://revistaplaneta.com.br/autor/deutsche-welle

17/10/2025 - 16:05

Após cessar-fogo, pessoas que ficaram em cativeiro agora enfrentam um longo caminho de reabilitação, que demanda esforço tanto das comunidades locais como de instituições internacionais.Ao menos 20 reféns israelenses mantidos pelo Hamas e mais de 1.950 prisioneiros e detidos palestinos sob custódia de Israel foram libertados e voltaram a seus territórios de origem. A troca foi feita no último acordo de cessar-fogo, anunciado na última semana.

Apesar da liberdade, o processo de reabilitação pode ser longo e complexo. Cada pessoa vivencia esse retorno de forma única — e não tem como prever como vai ser a recuperação de cada um.

“Na medicina de reabilitação, não falamos em cura, mas em cuidado”, afirma Avi Ohry, médico com mais de 50 anos de experiência em saúde pública em Israel e no mundo.

Dignidade e empatia: primeiros passos

Segundo Ohry, o primeiro passo essencial é restaurar a dignidade e oferecer empatia. Ele próprio foi prisioneiro de guerra durante o conflito de Yom Kippur, em 1973.

“Empatia é a chave”, disse à DW. “Tomar banho, comer algo, beber água, reencontrar os entes queridos.”

Cuidados médicos e psicológicos imediatos também são cruciais neste primeiro momento.

Ao longo dos dois anos do conflito entre Israel e o Hamas, observadores internacionais e especialistas em direitos humanos da ONU afirmaram que reféns israelenses foram submetidos a tortura e abuso sexual durante o cativeiro e que prisioneiros e detidos palestinos sofreram tortura, violência sexual e de gênero em instalações israelenses.

Ohry destaca que profissionais de saúde — tanto israelenses quanto palestinos — precisam agora entender como era a vida de cada pessoa antes do cativeiro e o que enfrentaram durante o período de detenção. “Quanto sofreram, quanto foram interrogados e torturados. Do que foram privados: comida, água, tudo.”

Alguns podem estar desnutridos e precisar de acompanhamento nutricional cuidadoso para evitar a chamada síndrome da realimentação. Ela ocorre quando a pessoa volta a se alimentar muito rapidamente e o metabolismo muda de forma brusca, podendo causar sintomas respiratórios, arritmias e falência cardíaca.

Apoio psicológico e escuta sensível

Além dos cuidados físicos, o suporte psicológico é indispensável, com escuta e acolhimento sensíveis.

“Eles precisam falar sobre o que viveram. E também é preciso reacender a esperança em seus corações e mentes”, afirma Khadar Rasras, diretor-geral e psicólogo clínico do Centro de Tratamento e Reabilitação na Cisjordânia ocupada.

Para a ONG britânica Hostage International, que atua em defesa de pessoas que foram feitas reféns, o tratamento psicológico das vítimas deve ser conduzido por especialistas em trauma. Até as lesões físicas podem dificultar a recuperação.

O transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) é uma das consequências mais graves que podem surgir. Mas essa e outras condições se manifestam de formas diferentes para cada um. Nem todos os sobreviventes desenvolvem o transtorno — e os sintomas podem aparecer imediatamente ou até décadas depois.

“O ideal é um programa feito sob medida para cada pessoa”, diz Ohry. “Após o exame médico no hospital, o acompanhamento pode continuar em casa, com entrevistas empáticas e um processo lento de reconstrução.”

“Nem todos os prisioneiros de guerra desenvolvem TEPT. Pelo menos um terço pode apresentar sintomas em qualquer fase da vida.”

Reconstruindo o papel na sociedade

Além do cuidado individual, o apoio da comunidade é essencial. Ohry e Rasras destacam a importância da participação das famílias e das comunidades israelenses e palestinas no processo de reintegração social. Em casa, isso significa reconstruir o papel do sobrevivente na vida familiar, por exemplo.

“Quando a pessoa consegue se relacionar com quem está ao redor, nós também tentamos ajudá-la a encontrar uma carreira ou trabalho que possa exercer para viver uma vida digna”, explica Rasras.

No caso dos palestinos que retornam à Faixa de Gaza, o desafio é ainda maior. Com o sistema de saúde local devastado pela guerra, Rasras afirma que é altamente improvável que as organizações locais na Cisjordânia consigam aceitar, quanto mais tratar, prisioneiros libertados que necessitem de ajuda psicológica. Uma alternativa que poderia aliviar a demanda, segundo ele, são as linhas telefônicas de apoio.

Nesse contexto, o papel das famílias e comunidades se torna ainda mais crucial, tanto em Israel quanto nos territórios palestinos.

“Nas fases posteriores da reabilitação, ocupação, moradia, círculo social, estudos, educação — tudo isso deve ser conquistado com o apoio do entorno: do Estado, do país, da comunidade”, afirma Ohry.

E mesmo quando o sobrevivente parece ter retomado seu lugar social, em casa e na comunidade, o cuidado contínuo é essencial. Isso porque o risco de o trauma ressurgir ainda se mantém.

“Algumas pessoas respondem bem à terapia. Para outras, o processo é mais demorado”, diz o psicólogo clínico.

Ambos os especialistas ouvidos pela DW enfatizaram a necessidade de um suporte financeiro a longo prazo para os libertados. Em Israel, isso significa manter uma rede de proteção duradoura. No caso dos territórios palestinos, Rasras defende que o apoio internacional será indispensável.

“Vai custar caro. Por isso é importante que a comunidade internacional apoie os centros que atuam nessa área”, conclui Rasras.

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